"Pela despinguinização do Direito!" (Luis Alberto Warat)

terça-feira, 23 de março de 2010

O segredo dos seus olhos


Imperdível.

Sobre o filme, encontrei esta entrevista na rede, que espero seja verdadeira, com o Campanella:


Acredita que o filme pode ajudar no debate, pela maneira como um dos personagens busca justiça?

- Justiça, não vinganza. Pode gerar um debate a partir disso. Certas coisas ocorrem quando o Estado não faz o que deve ser feito. Se as escolas não forem cuidadas, as crianças são educadas nas esquinas. Se não aplicar justiça, surgem estupidezes como uma parede de metro e meio. A perversão ocorre quando não se cumpre com a ordem natural das coisas.

- E o debate no plano político? Porque a novela abrange de 1968 a 1976, e um dos personagens nefastos é genro de um coronel, mas no final se centra em 1974-75, com uma cena chave no Ministério do Bem- Estar Social.

- Eu explico. A ditadura foi tão terrível que todos estes anos pusemos o foco nela. Mas muitos garotos, agora, crêem que tudo começou em 24 de março de 1976, por causa de uma inesperada invasão de extraterrestres. Pareceu-me mais interessante ver como é que certos limites num governo democrático começam a ser invadidos, no que se entende como uma democracia recuperada. O que se chama "o ovo da serpente", que mostramos nessas cenas, é o que permite fazer com que nossos personagens " percebam a transição", por usar esse termo. Como um bônus, os maiores reconhecerão também os planos do Altar da Pátria, e atos de prepotência que hoje parecem invenção de uma mente febril, mas existiram. Recomendo-lhe um livro de Marcelo Larraquy sobre López Rega. Além disso, comprimimos a história porque de outra forma teríamos que ambientar quatro épocas em vez de duas, diluindo o efeito "panela de pressão".

- É louvável toda a recuperação desses tempos.

- Sou obsessivo. No reencontro em 1999, como estavam as paredes dos Tribunais? Que celulares eram usados? Para os anos 70 estudamos muito La trégua (qualquer desculpa é boa para vê-la). Analisamos gestos, léxico, portafolios, cortes de cabelo, cinzeiros, discutimos sobre o papel que envolvia os torrões de açúcar Méndez ( fui até a fábrica em Barracas, não havia ninguém, sorte que na Internet encontramos um colecionador nostálgico). É incrível, mas essa década foi a mais colorida que possamos imaginar. A sorte é que ninguém ia de verde ou de laranja aos Tribunais . Na cena Retirando-se, tivemos a sorte de que os protagonistas são pessoas de cores sérias, rodeadas de cores brilhantes, fora de foco, o que vai com a descrição do narrador: o primeiro que recorda são os olhos dela, o resto é tudo impreciso. Igual tomamos uma licença na cena de futebol: nesse instante Furacão não tinha bandeja visitante, dado que poucos conhecem e poderia confundí-los.

- O que me confunde é como fizeram essa cena. Entre nós, como é que o senhor conseguiu essa impressionante tomada aérea que culmina com uma perseguição em primeiro plano, mistura de humanos e digitais? E pode durar cerca de seis minutos, sem notar nenhum corte?

- Avance quadro a quadro e não verá nenhum. Muitos sites de software de efeitos visuais já nos estão pedindo essa tomada, mas agora não vou revelar nada. Faz parte da diversão que todos se intriguem, querendo saber "como foi feito". Só direi que levamos dois anos de preparação, três dias de rodagem com atores e 200 extras, e nove meses de pós-produção, empregando em parte o programa Massive , usado por Peter Jackson em O senhor dos anéis. Os da produtora "100 bares" somos os únicos na América Latina que podemos e sabemos usar esse programa. Agradeçamos a nosso supervisor de efeitos visuais Rodrigo Tomasso, da região de Entre Rios, que faz cursos na América do Norte e esperemos que não o levem.


- O senhor também não.

Só vou quando devo filmar um capítulo de House ou A lei e a Ordem. Chego nas vésperas da pré-produção, que dura oito dias, logo me dão o roteiro, desenho como vai ser filmado, vejo o casting de atores que aparecerão nesse capítulo, filmo, edito e volto. Não diferencio entre filmar aquí e lá. Nossos técnicos e artistas também são muito bons.

- Em O segredo… alguém parafraseia o general Peron, "Se junto só os bons seremos bem poucos", mas em seus filmes se juntam uma quantidade enorme de gente boa.

- É certo, muitos me acompanham há muito tempo, como Ricardo Darin e Soledad Villamil, Chango Monti na fotografia, sua filha Cecilia, vestuarista, Mecha Alfonsin, diretora de arte, Fernando Prefeito, primeiro assistente de direção, imprescindível para uma rodagem ambiciosa como esta ou Walter Rippel, diretor de casting, que sempre me oferece dois ou três achados entre os atores secundários. Aqui, por exemplo, Mario Alarcón no papel de juiz e o humorista José María Gioia com uma pinta importante de polícia. Uma tristeza nos olhos, uma cara branca, obtida simplesmente ao diminuir essa energia tão efusiva que o caracteriza. Às vezes, as pequenas mudanças são tão grandes! Com o Francella foi suficiente tirar-lhe o bigode, colocar uns óculos de armação grossa e penteá-lo de outra forma. E com os personagens principais, foi suficiente colocar dois sobrenomes; um título para ela e o sobrenome Expósito para ele. E que ambos atores, num ensaio, começassem a se tratar de maneira mais formal. Com isso, já ficaram definidas as distâncias, e as possibilidades de complementação e apreço através do trabalho cotidiano: ela aparece com toda a educação, e ele com a rua toda.

Conto-lhe também que a busca do sobrenome dele foi extensa e só conseguimos resolvê-la três dias antes de começar a filmagem. Descartamos o da novela, Chaparro, porque no México isgnifica baixinho e causaria graça. Roccatagliata também, porque nos recordava uma criatura de Nini Marshall. Expósito é o sobrenome perfeito. Real, musical, nada cômico, além do sentido de menino abandonado na porta de um hospício.

- De quem são "seus olhos"?

- Vantagens do castelhano. Podem ser dele, dela, de outro, ou dos demais. Este jogo em inglês não é aplicável. Puseram-lhe o nome de The secret of their eyes, não me convence. Tomara que alguém encontre um título em inglês que faça justiça ao filme.
__________________
Daniel Sendrós. Publicado na revista Criterio, www.revistacriterio.com.ar e no http://www.miradaglobal.com

Nenhum comentário: